terça-feira, 12 de agosto de 2008

RONALDO PAIXÃO

(Ronaldo na praia da "sorte")




A gente herda um mundo de coisas de pai e mãe. O cabelo liso, a boca carnuda, um Wagner, Caetanos, vestidos puídos feitos à mão, regras, comportamentos, broches, poetas preferidos, padrões, sapatos, chapéus, sotaques. Aprende a tratar as pessoas, a ser gentil, a ter dignidade na derrota, a não ser besta na vitória, a dar valor ao que importa. Recheia a cabeça e o espírito com coisas que vêm claramente deles... Mas a gente herda, se tiver muita sorte, mais muita mesmo, um amigo precioso pra rechear o coração. Do tipo que desde sempre esteve lá, que já andava meio misturado na família, que aconselhava nas crises, comemorava as vitórias, dava livros de presente nos momentos de "retiro", que reconhecia ao ver meus filhos uma emoção legítima, que tinha um olhar doce e indomável pro mundo... que tinha um espírito capaz de transformar, com poucas e certas pinceladas, o feio em alguma coisa que valesse a pena botar atenção. Um cara que olhava pro meu pai do jeito mais puro e verdadeiro, que sabia dizer que o amava. Que quando viu meu filho recém-nascido deixou cair uma lagriminha trêmula e um riso largo "que lindo esse gene dominante". E esse cara, que de bônus me disse um dia que "nada na vida devia ser levado tão a sério que merecesse a minha infelicidade, nem mesmo a morte de um amor, nem a desistência, nem a falência do afeto ou a negação. Nada disso tem o direito de me fechar o coração"...esse cara morreu ontem (11 de agosto) de manhã, depois de ter repetido, ainda no domingo, uma única palavra, vezes sem fim: " a sorte, a sorte, a sorte, a sorte."


Meu pai escreveu o seu Réquiem.
Eu me calo.




RÉQUIEM PARA
RONALDO PAIXÃO



Sofro com a sua morte

uma das maiores desgraças

que se pode sofrer nesta vida.

Perdi alguém que me conhecia

e me perdoava. Alguém que me amava.

Com menos talento e generosidade,

eu também o conheci e o amei

- mas nunca precisei perdoá-lo.


***
A família de Ronaldo Paixão espera você para sua cerimônia de passagem, no dia 13 de agosto de 2008, às 10:00 da manhã, na Capela do Crematório Jardim Metropolitano. Cemitério s/n -Parque Araruama - Vaparaíso de Goiás.
RENOVAÇÂO

Já não falarei
de dor e de sofrimento
porque já não os sinto
em meu ser.

Falarei somente de um sentimento
que domina a mim
e a meu pensamento
do amanhecer até o anoitecer.

Falarei nisto, dia após dia,
neste algo, que agora sinto,e não sentia,
quando de minha vida
era o amanhecer.

Foi que passei por sobre o tempo,
caminhando contra o frio e contra o vento,
numa ânsia louca de viver.

Ronaldo Paixão, aos 13 anos - 1967


7 comentários:

Bela disse...

Que lindo post! Essas pessoas fazem a vida valer a pena, mesmo num momento desses. Pense nisso. Na sorte que você tem. Ele mesmo disse.

Muadiê Maria disse...

Ô Bela, que lindos sentimentos.
Estou tão triste, meu pai morreu dia 10 de julho e não está sendo fácil. Parece que quanto mais os dias passam mais a saudade aumenta.

um beijo,
Martha

Carla San disse...

Marida, não tenho o que dizer, apenas lamentar a perda e te dar o abraço que sabes, te pertence eternamente.
Liamo.
Beijos

Unknown disse...

Ô, Bela...

(abraço forte e sentido)

Comentários sobre arquitetura disse...

Eu te abraco com carinho nessa hora.

ludelfuego disse...

ô meu amor, fica bem, fica?

Vera disse...

ô, bela, sinto tanto...

beijos